sexta-feira, outubro 09, 2009

Concursos de Banda Desenhada - Subsídios para um estudo





Vinheta da banda desenhada "O Ataque do Planeta Vénus", de Inês Casais "Tetris", a quem foi atribuído o 1º prémio do Escalão A, no concurso de BD do Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora, em 2008


Capa do catálogo - incluindo as bandas desenhadas distinguidas - referente ao 2º Concurso de BD (2002) realizado pela Junta de Freguesia de Olhão


Prancha de banda desenhada vencedora de concurso, da autoria de Bandeira (José Bandeira), mais conhecido enquanto cartunista do que como autor de BD, embora tenha sido nesta arte que iniciou a sua actividade.





Sujeitos a tema ou livres de qualquer imposição temática, os concursos de banda desenhada - recorrente forma de criar actividades culturais e artísticas essencialmente para a juventude, bem como apoiar quem sente potencialidades nesta forma de arte - têm significativamente longa tradição em Portugal, visto que há registo da sua realização, pelo menos de um, em meados da já longínqua década de cinquenta do século passado.



Habitualmente, esse tipo de iniciativas é direccionada para ambos os sexos inseridos em escalões etários, cujos limites em geral não ultrapassam os trinta anos de idade, embora haja algumas excepções, repetidas em tempos recentes, em que não foi imposta limitação de idade aos concorrentes.


Na concretização dos concursos, ao longo do tempo, tem-se verificado o envolvimento das mais diversas entidades, públicas e privadas.


Nas públicas surgem estabelecimentos de ensino, mais propriamente as Associações de Estudantes de várias Faculdades (Arquitectura, Belas Artes, Letras, Instituto Superior Técnico) e escolas secundárias, mas igualmente instituições ligadas às autarquias, como foi em tempos o caso do extinto FAOJ - Fundo de Apoio aos Organismos Juvenis, posteriormente substituído pelo IPJ - Instituto Português da Juventude (por intermédio das suas delegações de Faro, Viseu e outras), bem como Câmaras Municipais através de pelouros ligados à Cultura ou à Juventude (Lisboa, Amadora, Moura, Loulé, Matosinhos, Odemira, Figueira da Foz), ou departamentos culturais - CNBDI, Centro Nacional de Banda Desenhada e Imagem/Amadora -, Secretaria Regional da Educação e Cultura (Açores), e até Juntas de Freguesia (Sobreda, Amora, Olhão).


Nas entidades privadas têm, ou já tiveram, lugar de destaque: CPBD-Clube Português de Banda Desenhada, GBS-Grupo Bedéfilo Sobredense, COMICARTE-Comissão de Jovens de Ramalde, GICAV-Grupo de Intervenção Cultural e Artístico de Viseu, Associação SOS Racismo - que, exemplo único até hoje, foi organizadora de concurso dedicado à criação de um argumento para BD (obviamente de temática relacionada com o racismo) -, UNICER-União Cervejeira, CPAI-Clube Português de Artes e Ideias, CNC-Centro Nacional de Cultura, Resarte - Rede de Expositores de Setúbal, três livrarias - Dr. Kartoon, de Coimbra, Barata e Qual Albatroz, estas de Lisboa -, e várias associações, culturais e outras, Alagamares, de Colares, Grupo Entropia, de Mafra, "Vírus", de Leiria, e a açoriana "Burra de Milho", de Angra do Heroísmo - Ilha Terceira.


De sublinhar também o curioso caso do concurso organizado pela Orquestra do Algarve, localizada em Faro.


Em diferente quadrante, têm sido levadas a efeito iniciativas similares, embora esporadicamente. Refiro-me a publicações de vária índole.


A precursora terá sido uma popular revista de BD titulada Mundo de Aventuras que, em meados dos anos cinquenta do século XX, realizou, sob um título algo ambíguo, o "Grandioso Concurso de Desenho", o qual abrangia diversas áreas: caricatura, anedota ilustrada (ou cartoon) e, naturalmente, banda desenhada.


Nos anos 90, a já citada livraria Dr. Kartoon teve também importante papel no assunto, ao organizar concursos e publicar as bedês vencedoras na Phylactère, sua newsletter.


Em 2008 surgiu um magazine, igualmente coimbrão, intitulado Maca que, embora não sendo de BD, se abalançou a iniciativa do género.


Em 2009, no Arquipélago dos Açores, Ilha do Faial, surgiu, facto inédito, um concurso de BD para uma só prancha, sem limite de idade máxima, num jornal, gratuito, trimestral, intitulado Avenida Marginal. Que conste, esta terá sido a primeira publicação jornalística a colaborar em tal tipo de iniciativas.


É ainda de registar o importante papel que têm desempenhado, na montagem de exposições relativas aos respectivos concursos de BD e na capacidade de as tornar visionáveis publicamente, os diversos eventos da especialidade: Festival de Banda Desenhada de Lisboa (organizado pelo desactivado CPBD entre 1982 e 1996), Salão Internacional de BD de Sobreda (Almada), Salão Internacional de BD do Porto (que já não existe, mas que foi inicialmente organizado pela Comicarte-Comissão de Jovens de Ramalde), Semana de BD de Amora, Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora, Salão Int. de BD de Viseu, Salão Int. de BD de Moura, Salão Int. de BD de Beja, BDteca - Mostra de Banda Desenhada de Odemira, e Vírus - Salão de Banda Desenhada de Leiria.


Ocorre à evidência que, para terem impacte público, os concursos de BD têm de ser complementados pela respectiva exposição, se possível na totalidade das pranchas originais de todas as bandas desenhadas premiadas - tanto as dos prémios principais como as das menções honrosas - e ainda, se houver espaço, para as dos demais participantes.


A última parte da iniciativa cultural e artística, que encerra harmoniosamente o ciclo, é a publicação das obras distinguidas pelo júri, completando assim a justa divulgação pública, iniciada com a exposição, dos talentos emergentes.


Nestes mais de cinquenta anos de realização de concursos da especialidade - em que o autor destas linhas tem tido numerosas participações como membro de júri, desde 1979 -, vários são os nomes, entre os vencedores de alguns dos prémios, que obtiveram notoriedade, designadamente: Álvaro, Pedro Nogueira, Agonia Sampaio, Ricardo Blanco, Marina Palácio, J. Mascarenhas, Serafim, Phermad, Francisco Vidal, relevando-se outros já como firmes referências na BD nacional, casos de António Jorge Gonçalves, José Carlos Fernandes, Nuno Saraiva, Jorge Mateus, Diniz Conefrey, Pepedelrey, Jorge Coelho, João Fazenda, Rui Lacas, Pedro Burgos, Ricardo Ferrand, Richard Câmara, Potier, Daniel Maia, Zeu e Miguel Montenegro - estes dois últimos com obra publicada, entretanto, no estrangeiro - ou Bandeira (José Bandeira), que constitui caso especial por ter passado a dedicar-se apenas ao Cartunismo.


Entre os que se limitaram à obtenção de menções honrosas destaca-se Carlos Rocha, que se tem evidenciado posteriormente pela publicação de numerosas bedês em fanzines e jornais regionais, assim como pela sua inclusão em exposições.


Também com participação positiva em concursos, há vários outros que, após curta obra bedística, optaram por trabalhar em ilustração ou publicidade, situação em que se podem incluir Pedro Sousa Dias, Rui Abrantes, "Micky" (Jorge Macedo) e o seu argumentista Miguel Corte Real, ou que se fixaram no ensino, como fez Ângela Gouveia, licenciada em Engenharia Química, ou os que preferiram dar seguimento profissional aos respectivos cursos, casos dos arquitectos Rá (Rui Alves), Miguel Cabral, Ricardo Cabrita e José Morim, estes dois últimos ainda com esporádicas aparições como autores, um em obras institucionais, fanzines e um recente álbum (Cabrita), ou de banda desenhada histórica, em álbum e livro escolar (Morim).


Obviamente que, na área da BD, como em outras artes, quem quiser singrar profissionalmente tem de conjugar talento com a indispensável formação técnica. Mas é indubitável que, como forma de primeira experiência e público incentivo para os iniciantes, a abrangente trilogia concurso/exposição/publicação - infelizmente nem sempre cumprida na totalidade - já deu suficientes provas dos seus méritos.


Geraldes Lino

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